sexta-feira, 1 de outubro de 2010

O ensaio que já não o foi

Qualquer coro deve sobreviver à saída de um maestro, mesmo do seu maestro fundador. Uma boa obra vale por si e não pelos seus protagonistas e deve, à partida, manter-se enquanto fizer sentido. Foi esta genericamente a mensagem que procurei passar aos coralistas na noite do dia 1 de Outubro de 2009, quando lhes comuniquei a minha decisão de deixar o coro.
Era dia de ensaio, e por isso aconteceu que a maior parte dos coralistas se dirigiu ao salão do secretariado paroquial, para o ensaio. Uns chegaram mais cedo, outros atrasados e alguns faltaram, por motivos vários, como quase sempre acontecia nos ensaios semanais, em particular nas semanas em que havia mais eventos, e na véspera o coro tinha cantado na inauguração do novo órgão.
Mas, desta vez, não havia partituras disponíveis nem se começou por vocalizar. O ritual não se cumpria porque este fora o momento definido (por mim e pelas pessoas mais próximas da direcção) para contar ao coro o que se passava.
Foi o meu último momento formal com o coro. Procurei geri-lo com auto-controlo, relatando os factos que estavam na base da minha decisão de me demitir, sem recorrer a bodes expiatórios ou teorias conspiratórias. Depois fiquei à disposição das pessoas para as questões que entenderam colocar-me e para me assegurar que, apesar de tudo, queria que os laços de amizade que criáramos se mantivessem, independentemente da minha saída.
Foi difícil dizer que saía e não foi menos difícil apresentar a minha decisão como um facto consumado. É certo que a direcção estava a par dos acontecimentos desde a primeira hora e ela representava legitimamente todo o coro, mas percebi individualmente a impotência das pessoas em me demover.
Os motivos estavam fora do coro e era por entender que feriam o coro na sua identidade que eu, pessoalmente, senti que deixava de ter condições para ficar naquele contexto.
A completar esta peculiar vivência do Dia Mundial da Música, apresentei as minhas cartas de demissão ao coro, na qualidade de director artístico, e à paróquia, enquanto responsável do Serviço de Música Sacra.

Sem comentários:

Enviar um comentário