
De amanhã a domingo, as notas neste blogue serão publicadas a partir de Londres, onde o autor destas linhas decidiu ir celebrar a 1ª Páscoa depois de 28 Páscoas consecutivas nos Jerónimos, onde teve acção directa na música litúrgica em mais de 150 celebrações do Tríduo Pascal.
A razão de ser desta nota prende-se com a influência da música coral inglesa, em geral, mas da experiência do Coro da Catedral de Westminster, em particular, na identidade do Coro de Santa Maria de Belém.
Convém não confundir com a Abadia de Westminster, que tem também excelente música, mas é uma igreja anglicana, com os seus ritos próprios.
Essa influência foi actuando directamente através dos inúmeros CDs do Coro da Catedral de Westminster no meu gosto e ideal vocal. Para além disso, estive várias vezes ao longo dos anos nesta catedral, em missas, laudes, vésperas, concertos, e habituei-me a seguir a vida da catedral através do seu site (onde aconselho vejam a dimensão do programa musical quotidiano) e através do blogue do seu anterior administrador, que diariamente partilhou detalhes da vida da catedral. E foi com enorme comoção que, há quase um ano, voltei à Catedral de Westminster, desta vez com o próprio Coro de Belém, dirigindo-o numa missa vespertina em que cantou no local exacto do coro que sempre segui e continuo a seguir.
Quem tenha ainda alguma curiosidade em saber porque cantava o nosso coro o reportório que cantava, porque usava as vestes que usava, porque cantava no local em que cantava, encontrará directamente em Westminster uma boa parte da resposta e em Regensburg (Baviera) também uma importante referência.
Mas a importância da Catedral de Westminster foi sempre tão determinante que quando, em Julho de 2009, fui a Fátima falar para coros no âmbito do Encontro Nacional de Pastoral Litúrgica, usei o exemplo desta catedral para falar da forma como a sua organização musical corresponde efectivamente às orientações do Vaticano II, em matéria de reportório, e falei também muito do lugar do coro.
Quem diria que um mês e pouco depois, seria por causa do lugar do coro que tudo começaria, ou mais propriamente, que tudo viria a acabar.
Nesta catedral, o coro é um coro de pequenos cantores. O canto do soprano é assegurado por 2 a 3 dezenas de crianças que vivem na catedral, com um regime de ensino integrado, e as restantes por cantores profissionais. O que é impressionante é que este coro canta nada mais nada menos que todos os dias na catedral, e na missa diária cantam gregoriano e polifonia (uma missa polifónica por dia) - geralmente o próprio em gregoriano e o ordinário de reportório polifónico. Aos domingos, é possível ouvir normalmente uma missa de Palestrina, Mozart ou de autores contemporâneos, pois a catedral tem o hábito de encomendar regularmente reportório para o seu coro.
E quem confrontar esta experiência com as recomendações da constituição conciliar sobre a Sagrada Liturgia, no que à Música Sacra diz respeito, não encontrará uma materialização tão fiel.
Algumas frases do maestro do Coro da Catedral de Westminster, Martin Baker, ajudam a perceber a organização espacial. Foram proferidas numa conferência que fez em Roma em 2005, nas Jornadas de Estudo no aniversário da Constituição Conciliar sobre Liturgia organizadas pela Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos:
• «Fazemos questão de assegurar que o coro é visto como parte integrante da liturgia. O coro e os ministros entram em conjunto enquanto o coro canta o introito gregoriano do dia. Os elementos do coro são vistos pela assembleia enquanto se dirigem ao local onde desempenham a sua função litúrgica. Através do canto na procissão de entrada, a própria palavra é iluminada pela música e pela acção. »
• Depois… «O coro canta num retro-coro atrás do altar principal, no extremo Este da Catedral. A música vem literalmente de cima, evocando a liturgia celeste. Vinda de trás da acção sagrada, a música ilumina e promove a comunicação entre o divino já que os homens se aproximam do divino através da beleza. E citando Radcliffe: A beleza não é a cobertura do bolo da liturgia, é a sua essência.»
• «O coro da catedral não poderia ser mais diferente de um coro de concerto. Enquanto que é visto no introito a caminho do seu local, não é completamente visível durante a missa e por isso não é uma distracção para os fiéis.»
Termino com o programa para os próximos dias na catedral…
Quinta Feira Santa: 18:00 Missa da Ceia: Missa Pange lingua Josquin; Dominus Iesus in qua nocte Palestrina; Ubi caritas Duruflé.
Sexta Feira Santa: 10:00 Ofício de Leitura: Eram quasi agnus Victoria; Iesum tradidit impius Victoria; Caligaverunt oculi mei Victoria; Christus factus est Anerio; 15:00 Solene Celebração da Paixão: Christus factus est Bruckner; Crux fidelis King John IV of Portugal; Passion according to John Victoria; Improperia Victoria; Civitas sancti tui Byrd; O vos omnes Casals; Lamentations of Jeremiah Tallis.
Sábado Santo: 10:00 Ofício de Leitura: Recessit pastor noster Victoria; O vos omnes Victoria; Sepulto Domino Victoria; Christus factus est Anerio; Office of Readings; 20:30 Vigília Pascal: Sicut cervus Palestrina; Exodus canticle Reid; Messe solennelle Vierne; O filii et filiae Baker; Dum transisset Taverner; Órgão: Incantation pour un jour Saint Langlais.
Domingo de Páscoa: 11:00 Missa Solene: Missa brevis Palestrina; Surrexit a mortuis Widor; Órgão: Choral-Improvisation sur le “Victimæ paschali” Tournemire. 15:30 Vésperas: Magnificat octavi toni Lassus; Moses and the Children of Israel Handel, Órgão: Paraphrase on Regina cæli Weitz. 16:45 Recital de órgão: J.S.Bach - Jesus Christus, unser Heiland BWV 665; C.Franck - Chorale No.1 in E major; Improvisation on Easter Themes.
E também algumas sugestões:
www.westminstercathedral.org.uk
www.choirschool.com
Santa Páscoa!