sábado, 31 de julho de 2010

São Paulo


A primeira actuação do coro em Londres era um desafio gigantesco, pela importância da Catedral de S. Paulo e, literalmente, pela escala monumental daquela igreja, cercada pela City mas bem visível do Tamisa e suas margens.
A manhã foi ocupada com passeios em pequenos grupos e reunimo-nos a seguir ao almoço para fazer o trajecto de autocarro até S. Paulo. O acesso dos autocarros até à zona do colégio nunca foi muito fácil. Estacionavam pelas ruas próximas e depois era um jogo de adivinhação, com tanta gente à procura do autocarro.
Quando chegámos à catedral, os nossos acompanhantes foram dar um passeio pois faltava muito tempo e não tinham acesso à zona restrita onde iríamos circular e trabalhar.
A catedral tem um piso inferior, uma cripta, em toda a sua extensão, com lojas, bar-restaurante, casas de banho, uma capela para grupos mais reduzidos e a sala de ensaio. Como os coros ingleses cantam em cadeirais, num conjunto de assentos e estantes de madeira, mais ou menos ornamentada e iluminada, as suas salas de ensaio antecipam essa logística, reproduzindo em U pelo menos as estantes, geralmente em pinho. Os assentos estão quase sempre ausentes, até porque as estantes não são ajustáveis. São feitas para se cantar de pé e o espaço nestas salas, em edifícios históricos, nem sempre abunda.
Atravessámos a zona das lojas e apresentámo-nos no local indicado, com todos os elementos devidamente identificados. Entramos para essa sala, que tinha a dita configuração de estantes de pinho em U, encaixadas num piano de quarto de cauda. A sala tinha as paredes repletas de caixas de partituras, um pequeno órgão de tubos e casas de banho ‘privativas’.
Alguém nos veio saudar e dar as boas vindas em nome da catedral. Fizémos a nossa preparação vocal e passamos uma frase ou outra. De seguida vestimo-nos e esperamos a indicação para subir para a catedral para o ensaio de colocação.
A entrada no cadeiral fez-se directamente por uma porta lateral. O coro tomou os seus lugares (em cada actuação havia um mapa detalhado com o lugar de cada um) e foi-me apresentado o organista.
Um dos desafios era cantar com o coro em duas metades acompanhado por um órgão gigantesco que tem a consola (e o organista) num plano mais elevado (corresponde a um 1º andar) e os tubos bastante mais acima. Em geral, as pessoas só identificam o órgão com as duas caixas de madeira trabalhadas e tubos dourados, mas, quando se visita a cúpula, podem ver-se tubos espalhados pelas galerias superiores, em especial os enormes 32 pés.
Mas o ensaio com o jovem organista foi, como esperava, tranquilizador. Um profissional que, do seu posto, e seguindo-me através de uma câmara de filmar, pôs aquela gigantesca máquina no nosso andamento, rigorosamente no meu tempo, só através do gesto, e ficou disponível para qualquer alteração que eu entendesse necessária. Não se perdeu em considerações ou sugestões. Fez o que dele se esperaria – acompanhar bem.
Depois veio o celebrante que tomou o seu lugar para ensaiar connosco os diálogos. Ao contrário das respostas ao canto do presidente na liturgia católica, aos diálogos nestas evensong responde-se a vozes. São frases curtas, mas incisivas. O encadeamento destas frases suscita um canto com atitude. Foi nesse sentido que nos esforçámos na nossa preparação e este pequeno ensaio agradou aos nossos anfitriões, que nos perguntaram há quanto tempo cantávamos em evensong. Na verdade era a primeira vez.
Treinámos o cortejo de entrada e saída da igreja e voltámos a descer à cave para uma pausa na sala de ensaio na cave. À hora definida, subimos e formámos cortejo numa parte lateral de onde saímos com os outros ministros em direcção ao cadeiral.
Nestas celebrações há os tais diálogos, pelo menos um salmo, leituras e, intercalado nestas, o canto dos dois cânticos evangélicos que os católicos utilizam respectivamente em Vésperas e Completas, o Magnificat e o Nunc Dimittis. Cantámos uma das imponentes versões de Stanford. Era o momento alto do ponto de vista musical e litúrgico, e o momento mais característico deste tipo de celebrações em concreto. Já perto do fim da celebração, é costume cantar um anthem, i.e., um motete em vernáculo, não necessariamente em inglês. Tinha visto várias vezes cantar em alemão ou francês nestes momentos e por isso não hesitei em propor uma peça portuguesa. Cantámos Sangue de Cristo, de Manuel Faria, que é uma peça notável e impressiva, simultaneamente com a base popular e de século XX que convinha, e o resultado foi muito bom.
Fim de celebração. Cumprimentos do celebrante que elogiou muito o coro, dizendo que estava perfeitamente dentro do espírito destas liturgias e tinha tido uma performance muito boa. As portas estavam abertas para quando quiséssemos voltar. Poucos dias depois da nossa chegada a Lisboa, recebemos esta nota de Fr. Jason Randell, responsável pela organização da vida litúrgica da Catedral:
The quality of the singing was exceptionally high and our worship was much enriched by your contribution. We appreciate all the time and effort which you and the Choir must have put into the visit and wishes to thank you for helping us maintain a constant round of musical services while the Cathedral Choir have been on holiday.
We much enjoyed having you with us and hope that you and the rest of the choir enjoyed the experience of singing in St Paul’s. As I mentioned, should you be ever back on tour this way again we’d very much like to welcome you back to sing Evensong for us.

Regresso ao colégio, noite livre, sessão de fotos, descanso.














PS: Todas as fotos na igreja foram tiradas no ensaio. Nenhuma foi tirada durante a celebração.

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